quarta-feira, novembro 08, 2006

Como perdeu a avó o último dente

Vou contar-vos como perdi o meu último dente…, começou a avozinha por dizer: …naquela altura trabalhava numa mansão como mulher-a-dias, pois nalguns dias era mulher e noutros nem por isso – era dingo ou tartaruga. Ás vezes tratavam-me também por coelhinha, mas isso era porque tinha apenas os dois dentes da frente.
Foi lá que eu conheci o André Son, o motorista oriental que tinha um ar de engatatão. O rapaz andava sempre atrás de mim, e uma certa noite, seguiu-me até à estação do metro. Eu até andava sempre de óculos escuros o que me fazia andar sempre a chocar contra as coisas… manias de juventude…
- iiiiiiiiiiiIIIIIIIIIII… Sr. André Son… - gritei eu quando o vi.
- O meu nome é Teo… - Dizendo isto tirou a máscara, num “mix” de Missão Impossível com Scooby-Doo e pude ver, ele afinal era o famoso Teodoseo Gago Tunas, e já sabia que tipo de joguinhos devia fazer para chegar ao meu pobre coração de manteiga.
- Fica quieta ou estás sujeita a YAZAAAA! Golpe de karateiiiiii... E olha que eu... sou mau! Sou mesmo muito mau. Então começou a saltitar pelas paredes, tipo bola de pingue-pongue, mas eu… nada, mantive-me imperturbável a fitá-lo. Na verdade eu começava a ficar um bocadinho aborrecida com todos aqueles saltos. Eu tinha marcação na manicure e cabeleireiro, e estava ali aquele fedelho fazer estranhas danças de acasalamento. Ahhhh, mas era tão bonito…
- Olha, não queres vir comigo a um sítio primeiro? É que tenho compromissos, e é uma chatice fazer as pessoas esperar. – Ele olhou-me surpreso, mas aceitou.
Assim fomos ambos tratar as unhas e fazer uma permanente. Sentadinhos com o algodão entre os dedos dos pés, as rodelas de pepino nos olhos e os rolos na cabeça, continuamos o nosso animado flirt…
- Assim que tirarmos estas coisas, tiro-te também as medidas…
- Ó meu querido! Já sou um bocadinho entradota para ti… - Apesar de ter dito isto, não pude deixar de sentir-me lisonjeada e a enrubescer. Um jovem a querer tirar-me as medidas… ai-ai, podia ser o meu dia de sorte, ou o dele… e pisquei-lhe o olho à descaradona. Ora, não tinha nada a perder. Decidi ir mais longe e passei a língua nos lábios de uma forma lasciva e oooooopa, saltou-me o penúltimo dente da frente e arrancou-lhe a orelha esquerda. Apesar de tudo continuou bastante atractivo. Eu no entanto, quando abria a boca ficava com um ar apatetado, mas acho que acima de tudo era amor que exalava dos meus poros, tanto que até cheirava mal. No meio disto tudo, o que importa é que rapaz ficou um bocado chateado por lhe ter arrancado a orelhita. Ainda o tentei confortar dizendo-lhe que se lhe faltasse a vista podia sempre usar lentes, mas não adiantou, ele estava arrasado e quis-me bater quando saímos. Eu até deixava, se não estivéssemos no meio da rua. Ainda me lembro, o meu fato amarelo de látex refulgia levemente debaixo das pálidas luzes da lua. Ah que bela figura que eu tinha naqueles dias (tinha-me saído num bolicao).
- Vou ter que ser mauzinho contigo, e não penses que me importa que tenhas sido treinada pelo Bruce Lee e pelo Ranger do Texas. Vou-te fazer a folha…
Tão querido ele era. Queria escrever-me um poema. Mas eu estava num dilema, e o mocito parecia uma matraca e não me deixava pensar direito. Eu que costumava brincar com o cajado quando estava excitada, tal era o meu estado de nervos que comecei a rodá-lo na minha mão, até parecer uma ventoinha. O resultado foi que ele saltou-me da mão, e PIMBAAAAA, acertou na testa do rapazito. Quando me preparo para ir ajudá-lo a levantar-se, PIMBAAAA. Não é que o raio do Tommy Lee tinha sido feito na Austrália? Voltou tipo boomerang, e lá está, como disse há pouco, PIMBAAAAAA, levei com ele na focinheira. Levantei-me a custo e apeteceu-me parti-lo para fazer lenha, mas derreada, decidi que era melhor chamar um táxi, para nos levar para casa. Então assobiei. Se soubesse não o tinha feito, pois quando o fiz, o último dente saiu disparado como uma bala e arrancou a orelha esquerda ao coitado do Teo…
Acho que foi a partir daí que nunca mais nos demos bem. Que se há-de fazer? Mal-entendidos e azares dão nestas coisas… Podíamos ter conversado, e resolvido as coisas, mas ele é tão cabeça dura… Bolas! Afinal eu também perdi dois dentes…
Paulo