A Galinha, que era um Galo…
A tarde estava finalmente a chegar ao fim, bem como as limpezas e aproximava-se a hora do jantar. Tinha sido um dia atribulado, ajudando a avó a preparar as doses diárias para os seus clientes. Como sempre, ela aproveitou para tirar uma sonecazinha no seu divã, enquanto nós nos esfolávamos para acabar de cumprir as tarefas de casa. Aquele seu famoso divã que já tinha a sua forma e a sua sombra, de tal forma que parecia estar sempre a olhar para nós. Era de arrepiar os cabelos do Filipe. Podia-se bem ouvir o roncar da avó, com os cães a uivarem a acompanhar. Podia parecer uma educação rude e áspera, mas raramente havia queixumes, ou então era Tommy Lee pelas costas abaixo. Tirava-se uma boa lição disto: “…pau de marmeleiro no chão, é bem melhor que tê-lo a varrer as costas…”.
- Oh vó, afinal o que é para jantar? - Perguntei, já com um concerto desafinado a tocar no estômago.
- Ah,… mas que cara#$#? Quem é que me acordou assim? - Berrava a avó, cuspindo pedaços de broa que ficaram a ruminar na boca durante o sono.
- Foi o Jaime. - Disse o Paulo com dificuldades, pois tinha broa colada na cara toda. ZÁS, e ZÁS. O primeiro ZÁS foi o Tommy Lee a falar-me na cabeça. Não recordo o que me disse. Devo ter adormecido um bocado, talvez passado pelas brasas. Deve ter sido isso, pois sentia a cabeça a arder. O segundo ZÁS foi em direcção do Paulo. Ele atirou-se para o chão, mas só conseguiu acertar com a cara em cheio no pé da avó. Parecia tudo premeditado, mas não creio. Acho que ele não queria acertar no pé da avó. Ainda se escapou do Tommy, mas ficou sem uns bons dentes. Já não teve de se preocupar com o siso.
- Não tinhas nada que me acordar assim dessa maneira, Jaime. Sempre a pensar no jantar. E tu, Paulo, não tens nada que ser bufo. Fica um cheiro pela casa que não se pode. Até parece que morreu um texugo ou outro ser vivo não identificado. Vamos comer coelho que já não tenho tempo para preparar mais nada. Até porque foi o que o meu carro apanhou noutro dia. Já está batido e tudo.
- Não podemos antes comer galinha, avó? - Pergunta o Filipe.
- Agora merecias uma boa porrada, mas fizeste-me lembrar desse velho amigo. Andávamos sempre juntos… Como era bom gozar com ele. Ai que saudades.
Éramos ainda muito pequenos nesse tempo, tínhamos umas recordações vagas. Devia ser por altura das marés vivas quando tudo se passou. Apareceu um galo esplendoroso na casa da avó. A sua crista brilhava de uma maneira que nunca tínhamos visto, mas se calhar era devido a termos colocado uma lâmpada nova à entrada. Mesmo assim ficamos tocados, ou seria dos efeitos secundários do sumo especial da avó, que bebemos ao lanche?
O galo e a avó ficaram muito amigos, mesmo uns verdadeiros compinchas. Era a perfeita simbiose, a avó comia e o galo apanhava os restos todos que saltavam da sua boca.
Só que uma certa noite, tudo mudou. A avó reparou num estranho sinal que pairava nos céus e saiu disparada para o seu carro, mas não reparou que o galo estava empoleirado no tubo de escape a fazer uns ruídos estranhos, no entanto, não desconhecidos. Eram parecidos com os que a Pamela fazia. Acho que devia estar a tentar aliviar alguma pressão. O carro da avó devia estar com problemas. Foi então que a avó arrancou a toda a velocidade e o galo saiu disparado pelo ar. Mais parecia que tinha entalado qualquer coisa no fecho eclair. Acho que ficou com qualquer coisa presa no tudo de escape da avó e que talvez tenha sido mesmo arrancada, pois a partir desse dia o galo começou a ficar diferente, mais parvo. A sua voz já não era a mesma. Parecia um soprano a cantar. E vínhamos a reparar que a sua crista altiva começava a diminuir a “passos vistos”, até que por fim, desapareceu por completo.
- Heee, olha o galo sem crista. Mais parece uma galinha. - Gozava o Filipe dando-lhe pontapés no traseiro. Era o que estava mais á mão. Não percebia este comportamento do Filipe. Tinha lógica era dar outras coisas no traseiro do galo. Afinal, ele tinha asas. Devia ser bem mais fácil de segurar do que as orelhas do Robim. No entanto, este comportamento era salutar. Desviava de nós as atenções da avó. Era bom ter outro bode expiatório. Aiii,… se fosse um bodezito. Nem que fosse só por um dia. Isso é que seria uma festança. Até convidávamos a Pamela e tudo. Afinal, alguém tinha que segurar no bode.
Por fim o galo fartou-se. Não aguentava mais biqueiros do Filipe. Ainda por cima eram de biqueira larga. Fugiu então de casa da avó sem nunca olhar para trás, nem para os lados. Por pouco servia de decoração do asfalto, não fosse o carro conseguir travar a tempo. “Cuidado!! Ai, galinha estúpida!” Passados uns tempos recebemos um postal dele. Tinha subido na vida. Disse que tinha conhecido um tal de Pratavotti, durante as suas aventuras no metro. Cantava ao desafio com o apito da estação. Formaram um grande espectáculo conhecido por Pratavotti and Friends. E foi este o destino do galo que era confundido com uma galinha.
Agora já sabem porque é que a galinha atravessou a estrada. Tudo por causa do escape do carro da avó.
Jaime
- Oh vó, afinal o que é para jantar? - Perguntei, já com um concerto desafinado a tocar no estômago.
- Ah,… mas que cara#$#? Quem é que me acordou assim? - Berrava a avó, cuspindo pedaços de broa que ficaram a ruminar na boca durante o sono.
- Foi o Jaime. - Disse o Paulo com dificuldades, pois tinha broa colada na cara toda. ZÁS, e ZÁS. O primeiro ZÁS foi o Tommy Lee a falar-me na cabeça. Não recordo o que me disse. Devo ter adormecido um bocado, talvez passado pelas brasas. Deve ter sido isso, pois sentia a cabeça a arder. O segundo ZÁS foi em direcção do Paulo. Ele atirou-se para o chão, mas só conseguiu acertar com a cara em cheio no pé da avó. Parecia tudo premeditado, mas não creio. Acho que ele não queria acertar no pé da avó. Ainda se escapou do Tommy, mas ficou sem uns bons dentes. Já não teve de se preocupar com o siso.
- Não tinhas nada que me acordar assim dessa maneira, Jaime. Sempre a pensar no jantar. E tu, Paulo, não tens nada que ser bufo. Fica um cheiro pela casa que não se pode. Até parece que morreu um texugo ou outro ser vivo não identificado. Vamos comer coelho que já não tenho tempo para preparar mais nada. Até porque foi o que o meu carro apanhou noutro dia. Já está batido e tudo.
- Não podemos antes comer galinha, avó? - Pergunta o Filipe.
- Agora merecias uma boa porrada, mas fizeste-me lembrar desse velho amigo. Andávamos sempre juntos… Como era bom gozar com ele. Ai que saudades.
Éramos ainda muito pequenos nesse tempo, tínhamos umas recordações vagas. Devia ser por altura das marés vivas quando tudo se passou. Apareceu um galo esplendoroso na casa da avó. A sua crista brilhava de uma maneira que nunca tínhamos visto, mas se calhar era devido a termos colocado uma lâmpada nova à entrada. Mesmo assim ficamos tocados, ou seria dos efeitos secundários do sumo especial da avó, que bebemos ao lanche?
O galo e a avó ficaram muito amigos, mesmo uns verdadeiros compinchas. Era a perfeita simbiose, a avó comia e o galo apanhava os restos todos que saltavam da sua boca.
Só que uma certa noite, tudo mudou. A avó reparou num estranho sinal que pairava nos céus e saiu disparada para o seu carro, mas não reparou que o galo estava empoleirado no tubo de escape a fazer uns ruídos estranhos, no entanto, não desconhecidos. Eram parecidos com os que a Pamela fazia. Acho que devia estar a tentar aliviar alguma pressão. O carro da avó devia estar com problemas. Foi então que a avó arrancou a toda a velocidade e o galo saiu disparado pelo ar. Mais parecia que tinha entalado qualquer coisa no fecho eclair. Acho que ficou com qualquer coisa presa no tudo de escape da avó e que talvez tenha sido mesmo arrancada, pois a partir desse dia o galo começou a ficar diferente, mais parvo. A sua voz já não era a mesma. Parecia um soprano a cantar. E vínhamos a reparar que a sua crista altiva começava a diminuir a “passos vistos”, até que por fim, desapareceu por completo.
- Heee, olha o galo sem crista. Mais parece uma galinha. - Gozava o Filipe dando-lhe pontapés no traseiro. Era o que estava mais á mão. Não percebia este comportamento do Filipe. Tinha lógica era dar outras coisas no traseiro do galo. Afinal, ele tinha asas. Devia ser bem mais fácil de segurar do que as orelhas do Robim. No entanto, este comportamento era salutar. Desviava de nós as atenções da avó. Era bom ter outro bode expiatório. Aiii,… se fosse um bodezito. Nem que fosse só por um dia. Isso é que seria uma festança. Até convidávamos a Pamela e tudo. Afinal, alguém tinha que segurar no bode.
Por fim o galo fartou-se. Não aguentava mais biqueiros do Filipe. Ainda por cima eram de biqueira larga. Fugiu então de casa da avó sem nunca olhar para trás, nem para os lados. Por pouco servia de decoração do asfalto, não fosse o carro conseguir travar a tempo. “Cuidado!! Ai, galinha estúpida!” Passados uns tempos recebemos um postal dele. Tinha subido na vida. Disse que tinha conhecido um tal de Pratavotti, durante as suas aventuras no metro. Cantava ao desafio com o apito da estação. Formaram um grande espectáculo conhecido por Pratavotti and Friends. E foi este o destino do galo que era confundido com uma galinha.
Agora já sabem porque é que a galinha atravessou a estrada. Tudo por causa do escape do carro da avó.
Jaime