As Receitas da Avó
A minha mãe pediu-me certo dia para ir à avó para ela me dar a receita. Como já puderam constatar, ela tinha muitas.
Quando cheguei, ela estava com o seu chapéu preto e pontiagudo de cozinheira a preparar a sopa para a ceia no seu grande caldeirão de ferro, a mandar grandes gargalhadas histéricas - hihihihihihihihihihihihihi - (ela ficava sempre muito feliz quando cozinhava) enquanto o mexia com a sua grande colher de pau, de onde era exalado aquele típico cheiro putrefacto e o vapor saía em nuvens esverdeadas seguidas dos blop-blops das enormes bolhas a rebentarem à superfície. Deixem-me que vos diga que ela usava estranhos condimentos.
Cheguei-me então a ela e pedi-lhe a receita. Ela olhou-me com ar desconfiado e foi buscar o Tommy-Lee. Bateu-me com ele até ficar sem fôlego, e mesmo assim ainda levantou o braço a tremer para me tentar acertar mais algumas, mas teve que desistir de cansaço. Recomposta perguntou-me: “Que fizeste tu hoje para a tua mãe pedir para te dar a receita? Foi muito grave! Foi, foi… Eu só lhe dava a receita quando ela assaltava bancos, ou empurrava velhotas para os penhascos!”. Ainda matutei durante algum tempo, mas tive que encolher os ombros pois não me ocorria nada. Por fim, ela matutou também e olhando-me de cima abaixo riu-se e disse: “eh, desculpa lá! Não devia ser esta a receita…”. Pegou então num jarro de dois litros despejou vinho branco, cerveja, séménepe e açúcar e mexeu com a carcomida colher de pau, com bichinhos e tudo. Virou-se para mim e disse: “Bebe lá homenzinho!”
E lá levei eu a jarra aos lábios e comecei com pequenos goles, mas ela empurra-me a jarra obrigando-me a beber tudo de uma vez: “força!” Quase me afoguei, no entanto uma vez mais, sobrevivi. Sangue da avó sobrevive a tudo. “Somos como as baratas: pequenos, atarracados, feios e toda a gente se quer ver livre de nós…”, dizia ela muita vez.
“Gostaste da receita? Todos os da nossa família devem beber um assim ao fazerem 18 anos, e tu para um franganote não te saíste nada mal.”
“Mas, ic, óbó, ic, só tenho 13 ic, blurrrrrrrrrpppp”.
“Feeewwww” disse ela torcendo o nariz “mas arrotas como um marmanjo podre de 30, bem daqui depreendo que também não é a receita da ganz… mmm contra a gangrena… deixa-me cá pensar… para já é melhor tratar-te dessa buba terrível”. Dizendo isto, volta-se para mim, diz-me: “Vai à janela e chama o Gregório”. A cambalear cheguei à janela e chamei: “Ó Gregó…”. E mal tinha começado a gritar o nome. Entra um gajo feito Speedy Gonzalez, agarra-me, espeta-me uns dedos compridos e finos na garganta, faz-me uma cocigueira na epiglote e pronto foi “Gregó…rlrlrlrlrlrlrlrlrlr lrlrlrlrlrlrrlraum larharaurgr ah” e quando pensei que até a minha tripa ia ser expulsa pela boca, tudo termina com um fedor nojento. Expeli coisas que nem me lembrava de ter comido. Tinha até bonecos da playmóbil desaparecidos há vários meses.
Quando voltei, para perto dela, estava a ler o seu grande livro de receitas, aquele com a capa vermelha com uma estrela dourada, escrito por um tal de Santo Ananás, talvez à procura da receita que a mamã queria.
Entretanto ela começou a revirar os olhos e a cabeça (ainda gostava de saber como é que ela fazia tal coisa) e leu em voz alta. Qual não foi o meu espanto quando percebi que aquilo estava numa língua estrangeira qualquer, e ouvia sempre um assobio no final de cada frase. Entretanto lembrei-me que a receita que vinha buscar não era de culinária, mas sim a receita do médico que a mamã se tinha esquecido lá. Olhei para cima da mesa onde ela estava e decidi ir-me embora para não incomodar mais a avozinha com a minha burrice. Ouvi uns ruídos estranhos ao fechar a porta, mas não liguei, pois como já disse, avó divertia-se muito quando estava a cozinhar.
Quando cheguei à rua estava a chover sapos e tinha-se aberto um portal do inferno para a terra por onde entravam demónios muito ruins… estranho, não acham? Foi uma confusão terrível. Tiveram que chamar os Gostbostas para safar a situação, foi, foi, mas ao menos a música divertia: tan, taranranran, gostbostas! Hehehe. Na altura era uma música que andava sempre na boca do povo, que era o vizinho da frente, isto, até lhe partirem os dentes, claro…Mas pronto, uma vez que comecei a falar de receitas, para a próxima dir-vos-ei como a avó fazia os seus fondues…
Quando cheguei, ela estava com o seu chapéu preto e pontiagudo de cozinheira a preparar a sopa para a ceia no seu grande caldeirão de ferro, a mandar grandes gargalhadas histéricas - hihihihihihihihihihihihihi - (ela ficava sempre muito feliz quando cozinhava) enquanto o mexia com a sua grande colher de pau, de onde era exalado aquele típico cheiro putrefacto e o vapor saía em nuvens esverdeadas seguidas dos blop-blops das enormes bolhas a rebentarem à superfície. Deixem-me que vos diga que ela usava estranhos condimentos.
Cheguei-me então a ela e pedi-lhe a receita. Ela olhou-me com ar desconfiado e foi buscar o Tommy-Lee. Bateu-me com ele até ficar sem fôlego, e mesmo assim ainda levantou o braço a tremer para me tentar acertar mais algumas, mas teve que desistir de cansaço. Recomposta perguntou-me: “Que fizeste tu hoje para a tua mãe pedir para te dar a receita? Foi muito grave! Foi, foi… Eu só lhe dava a receita quando ela assaltava bancos, ou empurrava velhotas para os penhascos!”. Ainda matutei durante algum tempo, mas tive que encolher os ombros pois não me ocorria nada. Por fim, ela matutou também e olhando-me de cima abaixo riu-se e disse: “eh, desculpa lá! Não devia ser esta a receita…”. Pegou então num jarro de dois litros despejou vinho branco, cerveja, séménepe e açúcar e mexeu com a carcomida colher de pau, com bichinhos e tudo. Virou-se para mim e disse: “Bebe lá homenzinho!”
E lá levei eu a jarra aos lábios e comecei com pequenos goles, mas ela empurra-me a jarra obrigando-me a beber tudo de uma vez: “força!” Quase me afoguei, no entanto uma vez mais, sobrevivi. Sangue da avó sobrevive a tudo. “Somos como as baratas: pequenos, atarracados, feios e toda a gente se quer ver livre de nós…”, dizia ela muita vez.
“Gostaste da receita? Todos os da nossa família devem beber um assim ao fazerem 18 anos, e tu para um franganote não te saíste nada mal.”
“Mas, ic, óbó, ic, só tenho 13 ic, blurrrrrrrrrpppp”.
“Feeewwww” disse ela torcendo o nariz “mas arrotas como um marmanjo podre de 30, bem daqui depreendo que também não é a receita da ganz… mmm contra a gangrena… deixa-me cá pensar… para já é melhor tratar-te dessa buba terrível”. Dizendo isto, volta-se para mim, diz-me: “Vai à janela e chama o Gregório”. A cambalear cheguei à janela e chamei: “Ó Gregó…”. E mal tinha começado a gritar o nome. Entra um gajo feito Speedy Gonzalez, agarra-me, espeta-me uns dedos compridos e finos na garganta, faz-me uma cocigueira na epiglote e pronto foi “Gregó…rlrlrlrlrlrlrlrlrlr lrlrlrlrlrlrrlraum larharaurgr ah” e quando pensei que até a minha tripa ia ser expulsa pela boca, tudo termina com um fedor nojento. Expeli coisas que nem me lembrava de ter comido. Tinha até bonecos da playmóbil desaparecidos há vários meses.
Quando voltei, para perto dela, estava a ler o seu grande livro de receitas, aquele com a capa vermelha com uma estrela dourada, escrito por um tal de Santo Ananás, talvez à procura da receita que a mamã queria.
Entretanto ela começou a revirar os olhos e a cabeça (ainda gostava de saber como é que ela fazia tal coisa) e leu em voz alta. Qual não foi o meu espanto quando percebi que aquilo estava numa língua estrangeira qualquer, e ouvia sempre um assobio no final de cada frase. Entretanto lembrei-me que a receita que vinha buscar não era de culinária, mas sim a receita do médico que a mamã se tinha esquecido lá. Olhei para cima da mesa onde ela estava e decidi ir-me embora para não incomodar mais a avozinha com a minha burrice. Ouvi uns ruídos estranhos ao fechar a porta, mas não liguei, pois como já disse, avó divertia-se muito quando estava a cozinhar.
Quando cheguei à rua estava a chover sapos e tinha-se aberto um portal do inferno para a terra por onde entravam demónios muito ruins… estranho, não acham? Foi uma confusão terrível. Tiveram que chamar os Gostbostas para safar a situação, foi, foi, mas ao menos a música divertia: tan, taranranran, gostbostas! Hehehe. Na altura era uma música que andava sempre na boca do povo, que era o vizinho da frente, isto, até lhe partirem os dentes, claro…Mas pronto, uma vez que comecei a falar de receitas, para a próxima dir-vos-ei como a avó fazia os seus fondues…
Paulo
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